segunda-feira, 19 de março de 2012

Crucifixos na berlinda e Minha Humilíssima Proposta

Uma polêmica surgiu e despertou este blog de sua letargia pré-morte.

Os crucifixos podem ou não permanecer nas repartições públicas?

A imagem do Cristo crucificado, em seu momento de maior angústia que, por paradoxo religioso, significa também seu momento de maior vitória (vá lá, descontada a ressurreição…), deve permanecer presente em repartições públicas de um Estado-nação pretensamente laico?

Ora, se o estado é laico, então não. Não devem permanecer.

Pode-se argumentar, no entanto, que a nação brasileira tem um inato sentimento cristão. No entanto, esse argumento esquece ou, melhor, reduz o cristianismo ao catolicismo, tendo em vista que vários segmentos protestantes reconhecem qualquer tipo de imagem como forma de idolatria. Sendo assim, mesmo dentro do cristianismo, não há consenso sobre a imagem do Cristo crucificado.

Dessa forma, os crucifixos representam uma parcela do cristianismo, cuja utilização ou não, aliás, já foi até motivo de guerra.

Como então podemos manter um símbolo, ainda que muito querido pela maioria da população mas que para minorias pode significar algo totalmente diferente, possa permanecer no recinto que se diz imparcial?

Me lembrei daquele empresário norte-americano, cujo nome deletei de minha mente seguindo instruções de Sherlock Holmes, que politicamente nomeado como diplomata, afirmou que árabes e judeus não se portavam como verdadeiros cristãos.

Apesar de risível a opinião de nosso colega norte-americano, sempre temos nossa visão de mundo – e nossos valores com ele – como natural. Como óbvio. Como verdadeiro. E nos esquecemos que somos frutos de processos histórico-sociais distintos. Não estou me referindo apenas ao nosso irmão do outro lado do mundo, mas principalmente ao nosso vizinho. O que sabemos dele? Qual a sua formação, sua religião, enfim, sua visão de mundo?

Assim, para um árabe ou um ateu ou um budista entrar em um recinto público e se deparar com a imagem do Cristo, pode detonar uma miríade de significados distintos daqueles que “normalmente” um cristão, digo, um católico sentiria. E se esse budista, ou ateu, ou árabe estiver entrando com uma ação contra um católico? Não ficaríamos embaraçados com isso?

O binômio tolerância-intolerância religiosa sempre pendeu mais para um lado ou para outro, dependendo sobretudo (mas não necessariamente) da abertura cosmopolita da civilização. Na história recente, a tolerância surgiu no seio de um cristianismo fraturado e exausto de tantas guerras religiosas. Aliás, o próprio surgimento do Estado-nação, tal como o conhecemos hoje, implicitamente abre espaço para as várias práticas religiosas. Com a tolerância religiosa, quando essa questão deixou de ser uma questão estatal para se tornar uma questão privada, abriu-se o espaço para o próprio ateísmo propesrar – já fortalecido pela conquista científica do homem moderno. Assim, em meu humilíssimo ponto de vista, a laicidade do Estado é tão importante para os religiosos quanto para os ateus, discordando nesse ponto do texto de Hélio Schwartsman (Cindindo a cruz). Em um estado com uma religião única, a vida de todo mundo com outro deus ou sem deus nenhum fica muito mais difícil…

Mas, até aqui, eu me comportei demais.

Minha modesta proposta não é a de excluir o crucifixo das repartições públicas como um todo. Considero essa proposta ultrapassada…O Brasil, como nova superpotência, deve dar um passo adiante. Acredito que a melhor forma de o Estado tratar essa situação não é excluir a religião dos assuntos estatais. Ora, a religião está ou não está presente em nossas vidas? Diz ou não diz o que devemos fazer ou deixar de fazer em quase todos os aspectos de nosso viver?

Dessa forma, como ficaremos confortáveis quando o Estado exclui as religiões de seus recintos?

Bem, a solução que tenho em mente não é nada fácil, mas certamente iluminará a matéria de outra forma. O Estado deve incluir todas as religiões. Isso mesmo. Não só o crucifixo, mas também todos os outros símbolos religiosos: o Selo de Salomão, o Yin-Yang, a Lua Crescente, o Om, a Roda Dármica, o símbolo da Umbanda, etc. Enfim, todos os símbolos de todas as crenças presentes no mundo atual.

Sei que há um problema logístico, mas nada que a criatividade tupiniquim não possa superar. Podemos fazer uma sala de todas as religiões e, assim, manter o respeito perante todas elas. Dessa forma, as minorias religiosas em nosso país não se sentiriam menosprezadas e discriminadas. Seríamos o primeiro país polirreligioso do mundo – e não apenas laico.

Claro que inventaríamos um símbolo para aquelas religiões que não os possuem e mesmo um símbolo para ateístas (se é que não já existe tal…). Poderíamos mesmo realizar um concurso público nacional com esse intuito.

Além disso, o nosso laicismo radical poderia expandir para os feriados nacionais. Por que somente feriados cristãos? Todas as outras religiões têm direito a celebrarem seus dias santos! Teríamos muito mais feriados e o povo trabalharia com mais afinco nos dias de labuta…

Deixo, assim, minha proposta para o tema. Espero que eu tenha contribuído para o crescimento de nossa nação.

(Há, claro, diversos argumentos para se defender a permanência dos crucifixos nas repartições públicas, como: preservação do patrimônio, o exemplo do julgamento do Cristo, a preservação de nossa herança histórica, etc. Todos esses argumentos pecam no sentido de manter uma imagem especialmente religiosa em um recinto pretensamente laico. Ou somos laicos ou não somos. Se somos, então…)

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