O grande escritor
satírico – que nem de perto eu sou! –, ao denunciar as
injustiças, acusar os culpados e rir das hipocrisias, tem a
pretensão de poder mudar o mundo.
Todo escritor satírico
se alimenta das injustiças, dos absurdos, das hipocrisias,
denunciando-os por meio da hipérbole, do humor e, até mesmo, do
absurdo. E o coração do escritor satírico está cheio de justiça.
De justiça e de raiva, claro. Por que ele sairia por aí escrevendo
contra outros, contra comportamentos, se não estivesse cheio de fel
no coração, tão cheio que chega a vazar para outras tripas? E a
ilusão de que a sátira, por mostrar comportamentos tão
abusivamente hipócritas, por elevar ao máximo algumas das ideias
mais estupidamente estapafúrdias, possa despertar nos opressores
remorso e nos oprimidos revolta, para que a mudança, em algum
momento, seja factível. Sim, o autor satírico, mesmo aquele que já
está além da esperança, ainda nutre uma faísca de ilusão, de
miragem, de logro que sua verve, sua retórica, suas imagens possam
comover os imbecis e antas de que o mundo poderia ser outro, que o
mundo poderia ser flores para todos os lados, que o mundo poderia ser
paz e amor, todo mundo cantando, de braços dados, de sorriso
aberto...
Mas não! Não será!