segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Privada Pública ou Consideração Filosófica sobre a Grande e Pequena Corrupções


URINANDO.jpg


Muito agradável (neste exato momento, não consigo pensar em nada mais agradável) é acordar cedo, abrir a porta de casa e sentir o odor de urina velha e estragada.

Pois, muitos companheiros, irmãos, brasileiros adoram urinar na via pública, fazendo dela a sua particular privada. Sacam o seu falo para fora e, sem pudor nem vergonha, jorram a fedorenta excreção renal, líquido do interior de seu ser.



Esse mal (mal? pode ser considerado um mal?) não é apenas um mal dos cariocas, mas um verdadeiro mal nacional.


Mas quem pode culpá-los? Esses homens necessitados de se aliviar?! Se a Natureza chama, devemos obedecer e logo! Como podemos esperar que consigam por uns breves momentos se controlar (como esperar controle de seres humanos?) e encontrar um lugar chamado banheiro para, então, jorrarem os seus fluidos? É esperar muito do ser humano. Ainda mais de homens, como nós!


Assim, devemos suportar com bom humor o odor tão característico do urinar humano. Homens urinando nos postes! Homens urinando nos muros! Homens urinando no meio da rua!


Uma vez - e aqui vai um comentário individual, da experiência deste autor -, saindo de um venerável e velho prédio, deparo-me com a seguinte cena: uma mulher, sem eias nem peias, arria as calças, por entre dois carros estacionados (um sendo o deste pobre autor), e se põe a urinar! No meio da rua, tinha... Bem, não vou parodiar o poeta Drummond, mas vocês devem imaginar o grande prazer e conforto que senti ao ver aquela mulher fazer em público o que em privada deveria fazer. Sim, me senti nas nuvens! Nas nuvens da elegância e da educação!


Na esquina seguinte, havia guardas ou policiais, e, questionados sobre a baderna que estava ocorrendo, eles deram com os ombros e comentaram: "Logo, logo, é carnaval. É assim mesmo!"


Na época, fizeram muito pensar essas singulares palavras de nosso oficial. Logo, logo é carnaval! Não importa! Essas coisas não importam... O que adianta prender pessoas que só seguiram a natureza e, como cachorros, deixaram suas excreções para outros "animais" cheirarem? Uma leve multa levam e, depois, vão encher o caneco de cerveja em um boteco e, em seguida... Bem, vocês já sabem.


A nós, meros cumpridores da lei, dos bons costumes e da moral, pagadores de impostos cada vez mais exorbitantes, a nós, simples mortais, cabe apenas a conformidade!


O que farão se, em um dia de fúria, nós brigarmos com todos os porcalhões sem-vergonhas que mijam em nossas calçadas?!


Mas não! Não vou me levantar com ódio e vingança. Vou aproveitar o caso desses cidadãos urinadores em público para tecer algumas considerações filosóficas sobre a grande e pequena corrupções.


Outro dia, li sobre a Teoria das Janelas Quebradas (Fixing Broken Windows, só ver na wikipedia), dos renomados criminologistas James Wilson e George Kelling, que, em poucas e pobres palavras, afirmava que o crime é resultado da desordem. Se, em uma vizinhança, aparece uma casa com janelas quebradas, outras janelas serão quebradas. E, se ninguém fizer nada, logo casas serão invadidas, usadas por prostitutas e viciados, que atrairão outros mal-feitores para as redondezas e que roubarão, matarão, estuprarão os honestos cidadãos... Bem, vocês entenderam. O crime vem da desordem. O grande crime, do pequeno desleixo. Há uma grande e terrível escala, nesse caso, de degradação.


As ideias desses renomados criminologistas foram postas em prática na cidade de Nova Iorque (ou New York?) nos meados da década de 80 e começo de 90 do século passado. Nessa época, a cidade era um verdadeiro faroeste. Sem lei. Cidadãos inocentes viviam em constante temor. Todos temiam sair nas ruas.


Os metrôs eram o símbolo maior dessa onda de crimes. Vários assaltos e violências ocorriam no subterrâneo. Os metrôs eram todos pichados e quase ninguém pagava o bilhete de metrô. Um homem, chamado Willam Bratton, discípulo da teoria das janelas quebradas, contratado para dar um jeito nessa calamitosa situação. A unanimidade dizia que ele deveria focar nos crimes de maior repercussão. Mas Bratton disse não. Primeiro, acabaria com as pichações. Se um trem era limpo e pintado e, depois, pichado novamente, deveria ser imediatamente limpo. Os pichadores não poderiam mostrar as suas obras de arte!


E Bratton começou uma política de tolerância zero para o não-pagamento das fichas de metrô. Os guardas davam com os ombros (essa atitude lembra a de alguém?): para que se dar o trabalho de prender por uma pequena infração? Mas Bratton bateu o pé. Acreditava que muitos dos criminosos não pagavam o bilhete e que pôr ordem nesse setor seria um passo decisivo para diminuir o índice de criminalidade. Manteve 10 policiais à paisana e eles prendiam todos os espertinhos, algemando-os e deixando-os à mostra na plataforma, como exemplo (aqui nossos advogados gritariam contra a falta de consideração pelos direitos dos bandidos, isto é, seus clientes!), e, no final do dia, levavam todos para a delegacia. Também começou a ser feito um levantamento de todos esse pequenos infratores e o resultado foi espetacular. Cada um que entrava descobria-se uma coisa pior.


Com isso, os crimes no metrô foram diminuindo radicalmente. Bratton parecia ter razão. Quando Rudolph Giuliani tornou-se prefeito, nomeou Bratton chefe do Departamento de Polícia. Bratton continuou com sua política e deu resultados.


Mas por que estou falando desses gringos? A nossa situação não é singular? O nosso caso pode ser comparado com o deles, desses norte-americanos metidos à besta?


As imagens dos policiais dando com os ombros e - pior! - da mulher urinando na minha frente não me saíram da cabeça enquanto eu lia sobre a teoria das janelas quebradas e Bratton (no livro O ponto de virada de Malcolm Gladwell). Pois, pense, caro leitor, mas pense bem sobre o que, em seguida, me ocorreu.



Após ler e pensar o que acima escrevi, fui me deitar. Não consegui dormir (por causa da indignação, esse verme que nos devora?) e, quando me conciliei com o Morfeu, tive um sonho deveras estranho.



Estava eu a caminhar pela calçada quando vi um único homem encostar-se em um poste, abrir a braguilha e urinar. No meio da rua, no meio de toda gente. Fiquei espantado com tamanha ousadia, mas meu espanto ficou ainda maior quando percebi que ninguém ligava, ninguém se importava. E, depois, vi outro homem, na padaria, sacar sua arma e começar a mijar na porta mesmo do estabelecimento. Outro, mais idoso, também seguiu o mesmo caminho. Quando percebi, assombrado, que a maioria dos homens estava fazendo da rua sua pública privada. Até um funcionário da prefeitura! Um policial, igualmente! Corri, pois não aguentava mais o fedor! Mas, em todos os lugares, o mesmo e absurdo comportamento. E vi ainda carros passando sinais vermelhos e estacionando em locais proibidos. Policiais levando uma propina da boa. Vendedores de cds e dvds piratas vendendo livremente seus produtos piratas! Um absurdo após outro. Estava asfixiado pelo fedor e pela amoralidade! Sim, estava no inferno ou no Brasil...? Tudo estava errado! Só eu que via isso! A tv, em uma loja, onde o vendedor urinava perto do hidrante, transmitia políticos honrados, fazendo declarações e rindo. Depois, esses mesmo políticos apareceram urinando nas ruas de Brasília. Mas eles eram monstros gigantes, com tremendos falos, aparecendo ao lado do congresso nacional. E seu mijo era um rio! Um imenso rio de urina! E todos, em minha volta, começaram a rir e a comentar: "Fazer o quê? Se eu estivesse lá, também roubava tudo e todos! E você?" Foi o que me perguntaram. Quando fiquei calado, se espantaram. E começaram a me inquirir: não vai mijar, não? Não vai dar propina, não? Não vai roubar, não?



E fiquei com medo! Gritei! Assustado, corri e todos correram atrás de mim. Homens, mulheres e crianças, que urinavam na rua, me olharam angustiados! Estavam todos atrás de mim. Corri como se fosse minha última esperança! E, no momento em que me encurralaram, graças a Deus, acordei. Todo suado, é claro, mas não havia urinado na cama.



Liguei a tv e vi os casos de escândalos de políticos. Vi uma reportagem sobre os males das pequenas infrações! E - eureka!, gritei - considerei o que tinha lido e o que tinha sonhado! Vi, como uma imagem profética, a pequena corrupção, aquela do dia-a-dia, e a grande corrupção, aquela das grandes mamatas! Vi o elo entre elas, entre a propina que damos para o guarda (para liberar a nossa barra) e a propina que o político pede dos grandes empreiteiros! Vi que o rio de urina, que começa pequeno, transforma-se no amazonas de excreções (não só de urinas!) e de corrupções que empesteia nosso país! As janelas estão todas quebradas, mais quebradas impossível!, e todos fazem o que querem aqui!



É preciso um grande político! Um grande líder que tenha tolerância-zero com a corrupção! Um Líder que ponha em prática a teoria das janelas quebradas! Um líder que não tenha medo, nem teto de vidro! Um líder que tenha a moral ilibada e que não tenha medo de nada!



Mas que digo eu? Já não temos um grande líder assim?!? Tomara que ele tenha tempo para limpar esse país de cabo a rabo!

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Comente.
Assim que puder, eu libero (ou não...) o seu comentário.
Abraços.

Web Analytics